quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Sarah apresenta Ivete Sangalo...

Em sua casa em Salvador, a cantora falou de suas preferências culturais e de sua expectativa como mãe

por Sarah Oliveira

Ela é um mulherão. Lança moda, trejeitos, melodias, compositores; onde coloca a mão, a coisa vinga. Todo mundo quer ser Ivete Sangalo. Ou já pensou na possibilidade de ter um pouquinho – por algumas horas pelo menos! – daquele encantamento e energia (natural, diga-se de passagem. Sem uso de qualquer tipo de estimulante artificial, apenas de colheradas de frutas com açúcar cristal e leite em pó para criança pela manhã, acompanhadas sempre de um café com leite quentinho). Mas não é tão simples.

Ela tem noção dessa responsabilidade só que leva isso de uma maneira tão genuína que flui. Assim, Ivete vai dando certo. Sempre e em qualquer papel. Agora o de mãe é o que está deixando-a mais orgulhosa de si mesma. Sim, ela vai tentar parto normal, mas, se não conseguir, tudo bem. "Ele virá como quiser e sem sofrer, isso é o mais importante", ela diz. O bebê da Sra. Cady chega em outubro e ela para um pouco antes, mas já avisou que tirará licença-maternidade.

Claro, com todo o direito. Aos 37 anos, é cantora respeitada, bela, inteligente (não à toa todos os veículos de comunicação, até os mais irônicos, ficam aos seus pés), a mulher mais pop do Brasil. Mas ela é de verdade. E como isso faz diferença!

S: Ivete, como você avalia seu papel dentro da cultura brasileira?
Hoje eu tenho mais consciência disso na minha vida, sabe? Mas é inerente de um pensamento predestinado. E isso me deixa feliz. É visceral, mesmo. Eu nasci com a vontade de fazer música e essa paixão acaba permeando todas essas tendências que vou lançando e vão acontecendo literalmente, sem que eu planeje. As transformações musicais que eu mesma sofro e acho essencial, a moda, as besteiras que falo espontaneamente. Veja, eu lanço "Dalila" (de Carlinhos Brown), que é uma música bem carnavalesca, super-regional, ao mesmo tempo que lanço "Agora Eu Já Sei" (composição dela), que é uma balada romântica com um "approach" mais nacional. Isso é algo natural do meu caminhar, então acho ótimo eu desfrutar dessa liberdade que conquistei. Isso me permite ser criativa e falar com todos.

S: Você é, sem dúvida, uma das figuras mais importantes para as manifestações artísticas populares. De onde veio essa vontade de mergulhar tão a fundo nisso?
Eu gosto da arte popular. O sabor do popular é muito bom. Apesar de sua sofisticação, da sua complexidade e diversidade, ele é simples. Éfácil de você compreender, de peneirar. Pensando bem, acho que tem a ver com o fato de eu ter nascido em Juazeiro, no Sertão, uma terra banhada pelo rio São Francisco, onde a poesia tá impressa em cada lugar da cidade, entende? Claro que por eu também ter nascido na família em que nasci, com pai e mãe despretensiosos que sempre deram valor ao popular... Eu poderia ter outro discurso se meu grande barato fosse uma arte mais erudita, um jazz, um blues, músicas que amo também. Mas declaro numa boa aqui pra você que me sinto mais confortável nesse ambiente popular, é onde me abrem portas.
S: Por falar em abrir portas, o nome do seu novo trabalho, "Pode Entrar", é a sua cara, assim como todo o roteiro do DVD. A gente sente sua mão ali.
Em 2009 eu lançaria um disco normal, ouviria as músicas que os compositores me mandam, selecionaria o que curto e gravaria em estúdio. Mas eu acho que hoje, com essas milhões de possibilidades de execução de um produto – porque você faz um projeto pensando nele como um produto dentro do mercado, senão você gravaria seu projetinho e guardaria pra mostrar ao seus filhos, certo? –, eu pensei: por que não inovar? Meus fãs adoram acompanhar todos meus passos, saber o que eu como, ver minhas brincadeiras, conhecer um canto de minha casa. Em tempo de reality show (risos), eu achei uma forma de entreter através da música. Eu queria ter esse estúdio em casa e você sabe disso faz tempo. Demorou mas ele ficou massa, aí eu resolvi registrar esse DVD dentro do "Queridona" [nome do estúdio caseiro de Ivete] e chamar meus convidados. As pessoas entrariam na minha intimidade através da música. Todos entram na minha casa através do DVD, mas na verdade eu é que tô invadindo a casa delas. Sacou?

S: Quem foi o primeiro convidado?
Olha, a Bethânia era alguém que eu gostaria de ter convidado se eu pudesse desde que comecei a cantar (risos). Eu cresci ouvindo Bethânia, Lulu [Santos] e Mônica [Sangalo], minha irmã, com quem eu sempre sonhei em cantar, mas ela ainda não havia se adequado a nenhum projeto meu. Então, eles estão lá. [Marcelo] Camelo convidei pois é um excelente compositor, Saulo [Fernandes, da banda Eva], meu contemporâneo, em quem acredito, "Aviões do Forró", pois eu adoro forró, e Brown, que é o maior representante disso que você tá falando aí de saber mergulhar no popular e descobrir mil e uma possibilidades interessantes. Sopa no mel!

S: Você tem uma trilha sonora pra cada momento? Agora que tá grávida, o que ouve?

Eu tô lendo um livro chamado "Einstein Tinha Tempo pra Brincar", que ganhei no Dia das Mães deste ano do Tito, meu vocal. Existe essa cobrança em cima de uma mãe, do que ela deve ouvir em sua gestação. Se a mãe ouve Mozart, Beethoven, a criança vai crescer mais inteligente e tal. Não concordo. Lendo esse livro eu constatei que a criança tem que ser feliz e ser amada. O "olho no olho", a presença intensa dos pais no desenvolvimento da criança faz com que ela desenvolva um lado artístico e sensível mais eficaz. Por mim, essa criança nasceria ao som do "Timbalada". Tô programando uma trilha sonora pra hora do parto (risos). Mas tenho meus momentos, você sabe que sou aficionada por Stevie Wonder. Então, na hora de malhar, mesmo grávida, ele é o top dos tops. Tem os momentos de acordar e tomar café da manhã com Daniel ao som de Bob Marley, vou pra rua com Gilberto Gil, volto pra casa com Bethânia, aí tem o momento Elba Ramalho. Eu vou minha irmã...

S: Se você tivesse a chance de ouvir apenas uma música, qual seria?
Oôxe! Tá louca? Tem tantas... (pensativa). Bom, tem uma música de Stevie Wonder chamada "For your Love" que fala assim [começa a cantarolar: "For your love, I would do anything. Just to see the smile upon your face." (Pelo seu amor, eu faria tudo. Só pra ver um sorriso no seu rosto)]. Adoro "Ribbon in the Sky", dele também.

Enquanto Daniel Cady, 23, estava na sala trabalhando em cima de sua monografia (ele vai se formar em Nutrição pela Universidade Federal da Bahia no fim do ano), discretas, assim como ele, comentamos um pouco sobre o lado musical do "namorido" de Ivete.

S: E o Daniel te trouxe algo novo?
A gente tem uma relação com a música muito parecida. São os mesmos gostos musicais, senão não rola, né? Eu e ele somos fãs do Pat Metheny*. Aliás, a música que canto no meu DVD com minha irmã, que compus com o Gigi (músico da banda dela), foi inspirada no "3 por 4" das valsas de Pat. Quando Daniel ouviu pela primeira vez, pirou. A gente se conheceu e ele falou: "Adoro Pat Metheny, adoro Dave Matthews Band", e eu disse "Ih! Eu também". Ele adora reggae. Eu também. Bob Marley, óbvio! Mas ele me mostrou bandas de reggae bem roots. Ele toca bateria, percussão e ama. Ele ocupa mais o estúdio do que eu. Vive tocando lá. E manda bem, viu?

S: Você sai de uma entrevista ou de um show e corre para postar um feedback no seu blog?
Acho que as pessoas sofreram muitos anos por não ter acesso ao seu ídolo. Imagine, as fãs de Cauby, elas devem ter sofrido muito por não poder chegar até ele. Eu sou fã de Cauby e tive a oportunidade de conhecê-lo, isso já é um alento pra mim. No começo da carreira, Cauby era um fenômeno entre as meninas, um Jonas Brothers da época. E eram inacessíveis a elas coisas como os pensamentos dele, a música e a comida preferidas, quais são os bichos de estimação dele – coisinhas que o fã adora saber e até pensamentos, posicionamentos que o artista traz com ele sobre política, ecologia, cultura. E é bem verdade que eu gosto de manter um laço com os fãs, gosto de estar conectada com eles através da internet pra mostrar que, apesar de minha rotina ser atípica, eu tenho os mesmos hábitos que eles e, acima de tudo, passar esse meu positivismo característico. Você sabe que amor nunca é demais, todo carinho verdadeiro é bem-vindo. Então, por que não? Movimento pessoalmente meu blog, tô entrando mais ativamente no Twitter. O Facebook e Orkut são feitos pela turma que alimenta meu site oficial.

S: Você navega muito?

Bastante. Entro em sites de música, de outros artistas... Mas acho que o que mais acesso são os vídeos do Youtube. Leio os jornais todos pela internet, acho confortável e elucidativo. E adoro ver fotos minhas em eventos, claro! Adoro me ver nos sites (risos).
S: Tem um livro que ficou na memória afetiva?
Puts, quando eu era pequena, comia a coleção Vagalume com farinha e de colher (risos). Aí, depois da Vagalume, eu passei para Sidney Sheldon (mais risos) e depois de Sheldon eu dei um tempo, pois, como uma boa geminiana hiperativa, eu passei a ler esporadicamente o "glamour", a intensidade da literatura. Comecei bem com "Cem Anos de Solidão", Gabriel García Márquez, "Ensaio sobre a Cegueira", do Saramago, que eu prefiro bem mais que o filme, apesar de o filme do Meirelles ser genial, dos melhores baseados em livros, mas a sensação que tive ao ler foi outra coisa. Coincidentemente, li "Carandiru", do dr. Drauzio Varella e prefiro o livro também.

S: Você não consegue ir ao cinema sempre que quer, mas assiste a DVDs, certo?
Inclusive, outro dia vi um documentário de uma cobertura televisiva francesa sobre a música brasileira, que passa Maria Bethânia com 18 anos e Paulinho da Viola novinho. Achei isso na internet saracoteando enquanto procurava uns vídeos pra baixar. E (suspira) tem um filme chamado "The notebook", que traduzido pro português é "Diário de uma Paixão". Esse filme é de lascar o cano, irmã. Não tem essa densidade intelectual toda, mas fala de uma história linda de cumplicidade. É um filme que eu veria pra vida inteira, assim como "O Vento Levou", que também é show. Ia chorar toda vez. Quer saber? É bem meu lado romântico, de garota sonhadora, mesmo.

Questionário colherada (disponível também em vídeo. Confira!), por Ivete Sangalo

S: O que você gosta de comer de colher?
De preferência tudo. Até minha saladinha aqui em casa vem cortada pra eu comer de colher. Mas comer de colher feijão, farinha, arroz, carne e banana cortada em rodela é o que há.

S: Pra quem você dá uma colher de chá?
Pra mim mesma. Eu falo tantas besteiras que mereço às vezes uma colherzinha de chá! Ah! E pros caras que tão fazendo obra aqui em casa.

S: E quem merece uma colher de sobremesa?
Todas as mães merecem uma colher de doce de leite gostoso.

S: Em quem você bateria com uma colher de pau?
Eu dou umas pauladinhas nos meus amigos em momentos de equívocos e falta de discernimento, e o contrário também. Eu permito que eles me alertem.

S: Onde você meteria sua colher?
Ah, minha filha, isso é muito amplo. Onde sou chamada, onde não sou, onde não queria meter minha colher, às vezes acabo metendo. Principalmente no meu trabalho.

* Pat Metheny é dica boa da Ivete pra quem gosta de jazz. Eu também recomendo.

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